- Você por aqui,
chefe? Faz um tanto que não te vejo.
- Não dizem que o
álcool tira as ilusões? Estou aqui para comprovar essa teoria.
- O de sempre, eu
acho. Ela me desarmou todinho. Não me deu nem a chance de dizer não. E depois
foi embora, de fininho.
- Então vai ser o de
sempre também?
- Uhum. Um copo
d’água com dois cubos de gelo.
- Aqui está. Posso
perguntar uma coisa?
- Claro.
- Você vem nesse bar
há quase dois anos. Toda vez que tem um problema, principalmente com
relacionamentos. Imagino que esteja aqui para afogar as mágoas, correto? Porém,
sempre que vem, pede somente um copo d’água e vai para casa depois de um tempo.
- Correto.
- Por que não pede
uma bebida, digamos, mais forte?
- Nunca tive o gosto
para bebida. São poucos os drinks que estão de acordo com meu gosto. Cerveja
então, nem se fala. Mas acho que o principal motivo é que eu preciso sentir
tudo isso.
- Como assim?
- Se eu chegasse aqui
toda a vez que estivesse triste e tomasse um porre para ficar anestesiado e
esquecer tudo, que graça teria? Preciso estar triste e preciso sentir a
tristeza, sem procurar maneiras de simplesmente passar pela vida. Quero ser
feliz, mas não antes de andar por todo o caminho até lá.
- E por que aqui?
- Venho aqui mais
pelo sossego que tenho e, claro, sua companhia.
- Entendo. Então qual
o problema de hoje?
- É baboseira, Tom.
Tem certeza de que quer ouvir?
- Bom, você é o único
cliente ainda aqui e o bar só irá fechar daqui a duas horas. Tenho todo o
tempo.
- Então senta aí e
bebe junto comigo.
- Já estou pronto.
Qual o nome dela?
- Como sabe que o
problema envolve uma garota?
- (...)
- Tudo bem, tudo bem.
Mas não irei dizer seu nome. Um pseudônimo, talvez? Margô. Ela é morena, dos
cabelos negros e olhos cor de mel.
- Não é a minha
mulher, né?
- Talvez seja. Mas
isso não vem ao caso.
- Certo. Vou prestar
mais atenção ao chegar em casa. E se te encontrar na minha cama, espero que
tenha uma boa explicação.
- Enfim. Ela é uma
garota apaixonante (assim como sua mulher). Eu a conheço há pouco tempo, não
mais que um ano, então é difícil ainda saber o que ela acha de nós. Mas gosto
de pensar que coisas boas.
- Onde mora?
- Mora não muito
longe daqui, pouco mais de trinta minutos de ônibus. Lembro até hoje da última
vez em que fui lá. Ela me disse bem baixinho, como se, por alguns segundos,
isso tivesse escapado da sua mente: “Essa semana demorou para passar.”. Foi
maravilhoso, sabe? Perceber que, assim como eu, ela também queria que nossos encontros
acontecessem. Os dias que antecediam minhas visitas eram sempre os mais
difíceis. Eu mal conseguia prestar atenção em nada, se não a eminente hora em
que eu iria ver seu rosto na minha frente. Analisando agora, não sei se isso
foi bom ou ruim para mim. Mas posso afirmar que vê-la era sempre uma delícia.
- Imagino, então, que
vocês não se veem mais?
- Em algumas
ocasiões. Cada vez sinto que estou mais distante dela. Quanto maior é a minha
vontade de vê-la, parece que menor é a chance disso acontecer. Ou por não
estarmos destinados um ao outro. Ou por ela simplesmente não querer. Ainda não
sei dizer qual das opções.
- O que irá fazer
agora?
- Vou deixar rolar,
ué. Você sabe que não dá para somente um fazer a coisa funcionar, então não
vejo motivos para tentar. Não posso me dar ao luxo de ficar decepcionado com
qualquer coisa, mesmo com toda a expectativa que eu coloco sobre tudo. Também
sei ser meio talvez, meio que sei lá. Ficarei no meu cantinho de sempre,
deixando as coisas tomarem seu rumo. Se por um acaso do destino, ficarmos
juntos, ótimo, pulos de alegria. Caso não, tá tudo bem.
- E agora você está
aqui, bebendo um copo d’água com gelo.
- Como o
amor, depois do primeiro gole, é difícil deixar a bebida de lado. Por falar
nisso, pode encher o copo.
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