segunda-feira, 26 de maio de 2014

Dia 26 de Maio, 2014.

Querido diário,

é possível alguém querer tanto uma coisa, a ponto de sonhar e acreditar veemente que é verdade? Mesmo após acordar? Eu realmente achava que não. Que era pura bobagem e que era preciso somente deixar de pensar no assunto. Provei-me errado.
Eu não costumo lembrar muito dos sonhos que tenho, salve alguns que me marcaram de alguma forma. Uns tenho periodicamente, outros deixam-me tão abalado mentalmente que tudo o que consigo fazer é encarar o teto por alguns minutos. “Isso foi real ou não?”. Francamente, já não sei mais distinguir sonho e realidade. Acho que desisti após tantas repetições de situações que nem sequer haviam acontecido. Volte e meia me pegava olhando para um ponto fixo, pensando: “Eu já estive aqui?”, mesmo sem nunca ter cogitado estar naquele lugar, ou sequer conhecido. As coisas pioravam quando as situações não eram assim tão boas, vide meu próprio término de namoro. Isso me levava a crer em diversas questões, como destino e “tudo está premeditado”. Será que está? E se estiver? Posso mudá-lo? Quero mudá-lo?
Meu último sonho me fez acordar assustado. E suado. Muito suado. Por alguns momentos jurei que aquilo tinha acontecido no dia anterior. Infelizmente, não aconteceu. Ela estava tão linda, Tom. Usava o vestido azul que compramos juntos, após uma grande relutância por sua parte. Eu amava aquele vestido: acentuava tudo o que tinha que acentuar sem corpo milimetricamente esculpido de morena, sem passar nenhuma mensagem errada. Sem contar que combinava com suas mechas no cabelo, de mesma cor. Era coisa de outro mundo, posso te garantir. Pena só ter visto em uma ocasião. O sol realçava seus olhos cor de mel, que me miravam fixamente. Ela parecia apreensiva, querendo contar alguma coisa, mas ainda procurando as palavras certas. Em um certo momento, segurou minhas mãos e me puxou para um abraço. Ficamos ali, parados, por cerca de três minutos, sem falar absolutamente nada, somente ouvindo nossas respirações. Deitou sua cabeça em meu ombro e colocou seus lábios ao lado, sussurrando: “Estou grávida”. Lembro de ter um milhão de coisas passando pela minha cabeça, mesmo sonhando. Logo, raciocinei o mais óbvio: a criança não era minha e ela quis me dar a notícia pessoalmente. Fiquei com muita raiva, na verdade. No sonho e fora dele. Sei disso pois, quando acordei, estava com o corpo e, principalmente minha cabeça, extremamente quentes, apesar de fazer dezoito graus lá fora. A realização de que ela tinha se relacionando com outra pessoa e ficado grávida me fez querer sair daquele abraço e matar a primeira pessoa que eu visse na frente. A raiva tinha me dominado completamente, mas fiz um esforço para controlá-la. Afinal, eu tinha me comprometido a apoiá-la em qualquer situação. “Ele já sabe?”, perguntei, ainda recuperando minha voz, tentando parecer o mais calmo possível. “Não, você é o primeiro a saber”. Fiquei inquieto com aquela indagação, por motivos óbvios. “Eu acho que o pai deveria ser o primeiro a saber”. Ela tirou sua cabeça de meus ombros e voltou a me olhar fixamente. Pude novamente ver aquele rosto tão perfeito a poucos centímetros de mim. Uma parte de seus cabelos cobria a parte direita de seu rosto. Eu amava como ela ficava desse jeito, mas coloquei-os de volta em seu lugar, atrás de sua orelha, um hábito que adquiri ao longo do tempo com ela. Finalmente, ela inspirou e disse: “Esse é ponto, Vic, você é o primeiro a saber.”. Eu tinha uma resposta pronta, caso ela me dissesse alguma coisa genérica, mas acho que só abri a minha boca e fiquei lá, parado. Eu não sabia se ficava triste ou feliz, Tom. Por um lado, ela poderia querer que nós voltássemos e que eu criasse nosso filho junto com ela, o que eu estaria mais do que disposto de fazer. Porém, ela também poderia só querer me contar e ir continuar vivendo a sua vida normalmente (poderia existir algo como cortesia nesse momento?). Escrevendo isso agora, não tenho ideia de qual poderia ter sido. Acho que nunca saberei.
Eu acordei logo em seguida, querendo voltar e continuar com meu sonho. Somei a raiva de antes com a de não poder voltar para lá. Lendo agora o que escrevi, peço desculpas por isso parecer com uma novela. Não foi minha intenção. Acho que eu só queria compartilhar esse sonho com você. E, claro, manter minha cabeça ocupada enquanto faço. Eu queria poder ter a certeza de que tudo vai ficar bem ou que as coisas vão se encaixar em algum ponto. Que vamos estar tomando um vinho em algum restaurante e lembrando da besteira que foi ficarmos longe um do outro. Eu queria. Mas não posso. Não sei o que vai acontecer amanhã, muito menos nessa semana. Não me entenda mal, sei exatamente o que eu quero que aconteça, mas não sei o que se passa na cabeça dela. Não tenho a mínima ideia. Acho que nunca tive. Mas acho que isso seria simples demais, não é?
Os dias passam devagar, demais para o meu gosto. Tudo o que eu quero que aconteça, não acontece. Será que perdi meu direito de ser feliz, Tom? Joguei minha chance pela janela? Acho que eu e ela sabemos qual a resposta. O que devo fazer, então? Não consigo mais ficar assim, tendo conversas que são medidas pela pouca intimidade, limitadas, enquanto almejo por somente algumas frases suas, que acabariam com tudo isso. Quando finalmente temos algum assunto, geralmente termina onde não queremos, voltando para a estaca zero. Eu aqui e ela lá. É isso que a vida reservou para nós? Estou tentando. Fico sempre por perto, para não haver engano sobre meus desejos, mesmo que isso seja contra a ética da situação. Puxo assunto quando eu mesmo sei que não vai dar em nada, ou sei como vai acabar. E não posso ter ódio da situação ou, até mesmo dela, mesmo que isso significasse um impulso para eu sair desse lugar. Odiá-la parece realmente tentador, mas não consigo amar e odiar alguém. Afinal, ela não fez nada de errado, só largou o que achava que a impedia de ser feliz, ou de viver sem ser magoada todos os dias. A vida é dela, e eu não posso impedir que ela viva, mesmo que isso signifique não estar mais com ela. Não posso impedir sua partida. Todos os meus sentimentos por ela estão na mesa. Todos os meus erros estão na mesa. Não há mais nada que eu possa fazer, a não ser ficar por aqui. Esperando. Esperando meu momento de ser feliz novamente. Com ela.
Ela faria isso por mim. Enfrentaria todas as barreiras e continuaria ali, esperando por mim. Passaria por cima da dor que é ver alguém que você ama feliz com outra pessoa. Como já fez antes. E por muito mais tempo do que estou sentindo. Devo isso a ela. Devo isso a nós. Devo isso a tudo de bom que ainda resta dela. Devo isso a minha felicidade de ver seu sorriso.
 Vou ficando por aqui, Tom. Tudo o que escrevo é pra ela, mas não posso forcá-la a fazer nada, muito menos ler algo que possa a deixar mal. Mesmo sabendo que ela não irá ler as coisas que escrevo, pelo menos você pode. Foi um prazer, como sempre.           


Atenciosamente,
Victor Luiz.

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