quarta-feira, 28 de maio de 2014

Dia 28 de Maio, 2014.

Querido diário,

hoje foi o meu primeiro dia fora da minha cama. Digo, por vontade própria. Foi também a primeira vez que fui ao cinema como solteiro, em quase três anos. Eu fiquei animado com a ideia de finalmente sair de casa e esquecer um pouco tudo o que está acontecendo. Devia ter imaginado o que aconteceria.
Até a metade do filme, tudo ocorreu bem. Me desliguei totalmente do mundo que eu habitava e somente assisti a telona. O problema foi ouvir todos os beijos sendo dados ao meu lado, por casais diversos. Foi duro ouvir aquilo e saber que não tenho mais alguém comigo. Antigamente, eu ria disso, dizia que as pessoas precisavam respeitar os outros que estavam no cinema e guardar suas afeições para mais tarde. Porém, nunca tinha percebido o quanto isso faria falta para mim. Essa demonstração de afeição. Ter essa afeição. Mal consegui prestar atenção depois disso, sempre ouvia aqueles estalos típicos de beijos rápidos. Sempre me lembrava de tudo. De como era ter alguém para agarrar no cinema e roubar beijos. Fiquei triste, mas não demonstrei. Não queria estragar mais uma noite.
Saindo da sala, me deparei com um fantasma. Na minha frente, ali, parada, estava ela. Não tive como me preparar. Meu coração parou por cerca de três segundos. Respirei e pisquei. Vendo melhor, não era ela, só tinha o mesmo tipo de cachecol que ela usava. A partir daí, comecei a vê-la em todos os lugares, sozinha, acompanhada, muitas vezes com roupas parecidas. Chegou um momento que simplesmente parei de andar e olhei para cima. Vozes ocupavam minha cabeça. Frases aleatórias, memórias, todas com uma só voz. Pensei em ir pra rua e chorar, já que estava chovendo. Realmente pensei. Mas acho que já estou seco por dentro. No máximo, iria ficar como estava. Respirei e pisquei novamente. Olhei para frente e segui. Não olhei para ninguém, só segui. Peguei o táxi mais próximo e vim para casa. Me arrependo de ter ido, Tom. Eu pensei que hoje seria um dia para ficar longe de tudo, mas só consegui ficar mais perto ainda. Senti medo de encontrá-la ocasionalmente e ver o que não queria. Toda esquina era isso. Aquele frio na barriga de ver o que a sua mente já sabia. Não aguentaria. Provavelmente entraria em colapso e cairia ali mesmo, no chão.
Não sei mais o que fazer. Essa tentativa me fez repensar tudo o que eu pretendia fazer. De que adiantaria seguir em frente? Me diga. De que adiantaria acordar um dia pensando que estava bem e sentir um desespero ao ver sua sombra na rua? Está tudo muito confuso, Tom. Estou perdido. Mais do que já estava. E parece que ela não percebe isso, ou que finge muito bem não perceber. Parece que a cada dia ela se afasta mais de mim. Tenho a impressão dela achar que eu não a amo, ou que não estou sofrendo por ela. Sei que fiz muita besteira com ela, mas o que posso fazer? Não há mais nada a se fazer? Somente essa escuridão contínua que me ronda? Não tenho palavras para medir o quão arrependido estou de ter a feito sofrer durante todos esses anos. De não estar mais presente por ela. De não dizer que a amava o suficiente. De aceitar um convite seu e depois recusar, em cima da hora.


Atenciosamente,
Victor Luiz.

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